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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Batismo de Jesus

Domingo, celebraremos o Batismo de Jesus, Festa que encerra o Tempo do Natal. Este episódio suscita em nós uma pergunta, até mesmo, de ordem teológica: Por que Jesus quis se submeter àquele ritual de purificação, realizado por São João Batista? O próprio profeta contesta: “Eu devo ser batizado por ti e tu vens a mim!” (Mt 3,14). Evidentemente, Jesus não precisava daquilo, pois não tinha qualquer culpa, a não ser a culpa da humanidade, que Ele assumiu. Quis, entretanto, nos deixar o exemplo do que fazer e a lição de que ninguém é puro, a não ser Ele. Mergulhando no Rio Jordão, santificou, definitivamente, todas as águas, que se tornaram matéria dos Sacramentos do Batismo e da Eucaristia, que Ele iria instituir.
Os Evangelhos Sinóticos descrevem aquela teofania trinitária, com a manifestação do Espírito Santo em forma de pomba, e o Pai fazendo ouvir sua voz sobre o Cristo, que sai das águas: “Eis meu Filho muito amado em quem ponho minha afeição” (cf. Mt 3,16-17 e paralelos).
O Batismo é a fonte de todo bem que acontece em nossa vida, após o nascimento; é a raiz dos dons sobrenaturais que recebemos e a porta dos outros Sacramentos. A criancinha que se torna templo de Deus, embora ainda não possa acompanhar a riqueza litúrgica do Sacramento, irá desenvolver, ao longo de sua vida, todos os benefícios recebidos naquele momento único.

São Paulo fala, ardorosamente, dos efeitos do Sacramento: “Fomos, pois, sepultados com Ele na sua morte pelo Batismo para que, como Cristo ressurgiu dos mortos pela glória do Pai, assim nós também vivamos uma vida nova. Ora, se morremos com Cristo, cremos que viveremos também com Ele, pois sabemos que Cristo, tendo ressurgido dos mortos, já não morre, nem a morte terá mais domínio sobre Ele. Portanto, vós também considerai-vos mortos ao pecado, porém vivos para Deus, em Cristo Jesus” (Rm 6,4.8-9.11).
São João, na sua Primeira Carta, afirma que, pelo Batismo, recebemos em nós a semente de Deus, que se desenvolve, desabrocha e impregna todo o nosso modo de ser e de proceder: “Todo o que é nascido de Deus não peca, porque o germe divino reside nele; e não pode pecar, porque nasceu de Deus” (1Jo 3,9). O nosso ser torna-se outro, porque nos incorporamos ao corpo glorioso de Cristo, que continua, assim, a agregar novos membros, especialmente, através do Batismo e dos demais Sacramentos.
Deus nos deu a vida natural em vista da vida divina, que iríamos receber, “enxertados em Cristo” (cf. Rm 11,23-24). Todo esse Mistério é muito grande! Surge, desta forma, para nós a conveniência imperiosa de meditar muito mais sobre o Batismo. A inesgotável riqueza desta reflexão tem fecundado novas formas de espiritualidade, como o Neo-Catecumenato que, bem conduzido, sem se fechar em si, é uma das grandes espiritualidades do nosso tempo.
Como é que manifestamos esta vida divina? O seu sinal mais simples e visível transparece na nossa própria fisionomia: o sorriso sincero e o semblante sereno refletem a paz da alma, a retidão do pensamento e a coerência das atitudes. O exercício da vontade, impregnada do Espírito de Cristo, conduz à prática de atos de bondade, que a piedade cristã sintetiza nas “obras de misericórdia”.
A vida nova é a grande maravilha que aconteceu em nosso Batismo. Além de transformados, tornamo-nos participantes de uma família nova - a Família Trinitária. Por Cristo, no Mistério da Encarnação e Redenção, recebemos o dom da filiação divina. Filhos do mesmo Pai e irmãos de Cristo, somos assumidos pela Santíssima Trindade, no amor do Espírito Santo. Em consequência, a nossa família humana também é transformada, quando nos tornamos criaturas novas.
Além de recebermos uma família nova, recebemos um nome novo. O nome é tão importante, tão precioso, que cuidaremos de zelar por ele. Na Antiga Aliança, o nome identificava-se com a essência e a missão da pessoa. Conhecer o nome do outro significava confiança e intimidade. Assim Deus se dirige a Sião, conforme o texto do profeta Isaías: “Eu escrevi o teu nome na palma da minha mão” (Is 49,16). Deus como que abre suas mãos para nos guardar, pois nunca se esquece de nós. Estamos sempre no seu pensamento, no objetivo do seu amor e da sua atividade.
Quando uma criança aprende a falar, os primeiros nomes que balbucia são “mamãe” e “papai”, naquela pronúncia engraçada e imperfeita, que tanto enternece seus genitores. Nós também aprendemos a chamar Deus de Papai, Ele é o nosso Abba, como diz São Paulo (cf. Rm 8,15). Deus é Papai, com jeito e amor de Mamãe, unindo as facetas do amor humano na plenitude de seu Amor divino.
Como possuímos a vida divina, nosso falar transcende a comunicação humana. Alcançamos o falar divino, que é a oração – diálogo com o Pai, pelo Filho, no Espírito Santo. A oração é um dom extraordinário. Quem sabe rezar, preenche qualquer vazio e se enobrece. E quem não sabe rezar, é muito pobre. O maior sábio, se não souber falar com Deus, vai dialogar com quem? Apenas com a ciência e o mundo material? Mas tudo isso é limitado. Quem não sabe falar com o Transcendente, não se torna sábio de verdade. A ciência que vai além dos limites da criaturalidade é a ciência mais elevada, porque se eleva até o divino e se fundamenta na fé.
Quando recebemos a vela do Batismo, embora seja pela mão de nosso padrinho (no caso das crianças), somos convidados a prosseguir: “Ide, levai esta luz [isto é, a fé] acesa, até o encontro com o Senhor”. E nesta trajetória do nosso caminhar, há que preencher o entusiasmo da fé com a concretude da caridade, unindo o ensinamento de São Paulo ao de São Tiago: “A fé opera pela caridade” (Gl 5,6), pois “a fé sem obras é morta” (Tg 3,17)
Feliz dia em que fomos batizados! Nossa Certidão de Batismo, muito mais do que um documento, é sinal do maior dom do amor de Deus a nós. Olhemos para ela com carinho, agradecendo a Deus pelo Sacramento que nos abriu a porta e franqueou o acesso à participação na sua vida. O Batismo purifica o nosso ser e dá sentido ao nosso viver. Vai conduzir-nos pelos caminhos do bem ao encontro do Único Bem, razão e causa de qualquer prática que nos dignifica.

D. EUSÉBIO SCHEID

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